domingo, 13 de dezembro de 2015

As últimas horas de Pierre

Manhã. Consultório de Augusto.


BIANCA: Alô. Doutor Augusto? É o senhor que fala?
AUGUSTO: Sim, sou eu. Esqueça o doutor. Só psicólogo.
BIANCA: Doutor... Augusto, meu nome é Bianca. Eu era namorada do Pierre.
AUGUSTO: Meus sentimentos, Bianca. Fui informado da morte dele. Ontem. Eu não sei o que dizer. O Pierre era um dos meus principais pacientes, mas ele interrompeu o tratamento. Falei com a mãe dele. Tentei ligar pra ele várias vezes, mas nada. Seu namorado estava precisando muito de ajuda.
BIANCA: Eu sei. Não é fácil pra mim. Não consigo digerir. A gente não vivia uma das melhores fases. Você sabe bem como ele era. Montanha-russa. Sumiu várias vezes nas últimas semanas. Até isso acontecer.
AUGUSTO: Eu entendo perfeitamente. Transtorno bipolar não é fácil de lidar. E o quadro depressivo dele estava se agravando. Eu já havia passado a recomendação para um psiquiatra. Falei com um amigo, indiquei. Fiz o que pude. Mas, enfim... Não deu tempo.
BIANCA: Então, doutor, eu estou ligando. É porque eu acho que ele não se matou. O Pierre foi assassinado, doutor.
AUGUSTO: O quê?
BIANCA: Alguém matou meu namorado. Ele não estava bem, eu sei, mas ia fazer aquilo daquele jeito. Ele era orgulhoso. Não ia deixar seu corpo terminar num lugar como aquele. Só pode ter sido alguém da família dele.
AUGUSTO: Bianca... Bianca, faz o seguinte. Passe aqui, à uma da tarde. Pode ser? Eu converso com você no meu horário de almoço. Vai ser melhor, por gentileza.
BIANCA: Eu? Por quê?
AUGUSTO: Você precisa. Ok? E não conte nada disso pra ninguém? Você já sabe onde fica meu consultório. Tudo bem?

Telefone desligado. Augusto coloca os óculos e vai até a estante, pegando um caderno com o nome de Pierre escrito na capa. Dentro dele há algumas folhas soltas. Augusto senta-se, bebe uma golada de café e abre o caderno, começando a olhar os desenhos. Um deles traz um rosto masculino com cabelos desalinhados e olhos fechados, caídos. Outro traz uma mulher em lágrimas. Noutro, uma criança pequena está solitária no meio de rua em meio a adultos de pernas compridas passando.

AUGUSTO: Eu sou um grande incompetente ou você conseguiu me enganar, Pierre? Eu contribuí pra isso acontecer? Por que não mandei que te internassem, seu louco? Morto. Assassinado? (riso nervoso) Por que eu não virei advogado?

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